kalekela Paz

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quarta-feira, 5 de setembro de 2012

CASSETE SALVA PESSOAS


CASSETE SALVA PESSOAS
 Ora, os jemeias tinham vários tipos de estratégia para agarrarem pessoas para ir à tropa ou para as moças se filiarem na jura, organização femininas dos jemeias. Um deles é este: A partir de Agosto, quando o povo começa a trabalhar nas lavras, os jemeias paravam de rusgar. E assim, os bairros estavam calmos, e o povo trabalhava em paz. Até os que fugiam para Gabela, Sumbe e Luanda, áreas consideradas de "zonas dos Sabeus " (MPLA) „ voltavam para os seus bairros controlados pelos jemeias. Eles não voltavam porque gostavam de jemeias ou Sabeus; Eles eram pacatos cidadãos e trabalhavam para sua sobrevivência. E assim faziam, não somente os do Kwanza-Sul, os de Benguela, Bié e outros pontos de Angola faziam o mesmo. Os jemeias não rusgavam, durante os três meses de "niminó” (Semeaduras, sacha e capina). Nesse caso, as pessoas enchiam os Bairros e os trabalhos nas lavras iam de vento em poupa. E o povo esquecido, estava em paz, porque nenhum soldado jemeia passava no Bairro incomodar gentes,  senão  pedir comida para a tropa.
 Mas, de Janeiro à Agosto e quando os mantimentos já estão prontos para a colheita, os jemeias começam a rusgar porque os Bairros ficam repletos de gente e assim, os soldados conseguem apanhar muitas pessoas e enviá-las para longe da família; e foi o que aconteceu; Avô Enviado estava no Bairro Capunda e estávamos em Fevereiro de mil novecentos e noventa e quatro. Menezes Godinho tinha ido à Kibala visitar sua mulher e buscar Yola, a filha dele. Avô falou com Zito e Beto para que entrassem na casa Kalekela à fim de gravar umas cassete de hinos de louvor, como era o costume dos Kalekela. Beto e Zito, com as quatro meninas entraram na casa Kalekela. Naquele momento surgiu um batalhão de tropa jemeias e cercaram o Bairro todo. O batalhão estava dividido em três e o primeiro grupo estava na pedra da Capela Católica, olhando para classe onde estava Avô Enviado. Um dos jemeias entrou na classe e olhou pela janela da casa Kalekela para ver se tinha alguma pessoa escondida lá. Mas o protetor dos filhos do Deus Eterno fez com que o homem não visse ninguém. Mas as lindas moças que os jemeias procuravam estavam mesmo dentro de casa e também os moços que tinham forças para agarrarem em morteiro estavam com elas.
Beto porém, saiu de casa para cozinha conversar com a mãe Rita. Mas não conseguiu falar à mãe o que tinha lhe levado lá, porque o Jemeia que tinha olhado na janela da casa Kalekela o chamou e mandou que fosse à pedra junto aos outros apanhados. O soldado alegrou-se tanto com isso e disse:
“Que vitória! Os homens fortes que precisávamos estão aqui em Capunda! Agora já vencemos! Vamos embora, mas voltaremos amanhã.”
 Enquanto isso, Rita a mãe do Beto saiu rapidamente da cozinha e foi ter com Avô Enviado. Entrou no quarto sem pedir licença e gritou para Avô: “A pai, a Tatetu! Omoná yaya laye! Toka u mumbulule” (ó pai, nosso pai. O teu filho vai aí com os jemeias! Vem e salve-o, por favor.) Avô saiu depressa e dirigiu-se para a pedra onde estavam os apanhados e os soldados. O que estava em frente dos apanhados era Beto. E é para lá que Avô se dirigia. Avô Enviado e o irmão Ângelo falaram com o comandante do batalhão à favor do Kalekela Beto. Mas os outros apanhados e os soldados recusaram deixar Beto em paz; os outros tinham ódio dele. Avô explicou a situação do jovem Beto. Ele disse: “O meu Beto é doente e está aqui para ser curado. Ele também nos ajuda.”
O comandante quis deixar Beto ir com Avô em casa. Mas os soldados agitando ainda mais ao comandante, disseram: “Ó mais velho. Este homem é muito forte e já dá para pegar numa mochila com cartucheiras e um pé kapa eme. Como é que o mais velho deixa ir o homem? Isso não dá! Nós também deixamos nossos pais e casas.”
 Avô Enviado respondeu, baixando a cabeça: “ Ó irmãos e companheiros! Beto não está indo à tropa, não é porque gosta só estar em casa ou porque tem mulher. Conforme vocês estão vendo, o irmão já esqueceu a mãe e não sabe se tem pai. O pai e a mãe sou eu, e mesmo assim já somos tropas, lutando pela pátria, com músicas. Se o mais velho já ouviu falar do grupo Kalekela, cujo promotor e dono é Avô Enviado. Este grupo já atuou em várias províncias do nosso País. Mesmo na campanha eleitoral de 1992 o grupo tocou para apoiar os dois contendores políticos. Mas os Kalekela não têm partido nem religião. Eles são como a cruz vermelha Internacional, em tudo entram. Por isso é que o grupo Kalekela toca até na base do horizonte.”
 Quando o comandante ouviu as palavras do Avô ficou muito comovido e disse para os seus companheiros: “ Que humildade tem este menino! Que exemplo de coragem! Afinal no meio dessa arrogância e injustiça existe ainda justiça e honradez: No meio dos assassinos e desprezíveis como nós, existe ainda bons homens e valorosos. Só como este homem respeita os superiores, parece Jesus Cristo que respeitou os seus pais e amou ate as crianças. Agora pergunto: Onde está Avô Enviado? Eu já o ouvi dizer, a sua fama corre por toda a parte e até o nosso querido presidente o conhece. Onde está ele?”
 Avô Enviado respondeu: “Sou eu. Este que, com o meu comandante fala é mesmo Avô Enviado.”
O comandante perguntou, dizendo: “E tens ali uma das vossas cassetes?” Avô Enviado disse que tinha e mandou que o irmão Ângelo buscasse a mesma na casa Kalekela. Ângelo trouxe duas cassetes, a do grupo Kalekela e a do Pepé Kale, um músico congolês. O homem recebeu as duas, mas preferiu a cassete do Kalekela e agradeceu muito ao Avô Enviado. Dizendo assim à ele: “Ó meu Avô, meu mestre. Não me esqueças, por favor. Guia-me durante este tempo mau ate ao advento da paz. Fica comigo e não me deixes, só por causa dos meus pecados. Quando a paz chegar, quero ver o meu pai e a minha mulher e meus filhos. Tenho a certeza que assim será!” Avô Enviado respondeu-lhe, dizendo: “Seja feito conforme a tua fé.”
 Depois o comandante mandou soltar Beto e entregou-o ao Avô Enviado. Este porén mandou que Beto fosse com Ângelo até à casa Kalekela. Rita, a mãe de Dezanove e Beto Micael observava tudo à porta de sua cozinha e estava feliz quando viu seu filho à sair das garras dos jemeias.
 Cinco jovens levantaram-se da pedra e foram levar Avô para casa. Mas não voltaram mais para junto dos soldados jemeias. Já eram duas da tarde, hora limite para os jemeias ficar no bairro. Foi dada a ordem para o batalhão se retirar, e os três grupos foram juntar-se à casa do soba José Mambo. O comandante e os militares que estavam na pedra da Igreja católica, retiraram-se dali com toda pressa, esquecendo-se de que tinham deixado mais dez pessoas. Quando os dez apanhados viram que os jemeias foram embora, fugiram com as suas cordas para as lavras de Camboti. Mais uma vez a libertação estava nas obras da fé do Enviado, pois, com uma cassete, salvou pessoas e não deixou que fossem levados pelos jemeias.

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